Friday, December 28, 2007

Mysterium Tuatarensis

Acerco-me de uma rua estreita e pouco iluminada, mas com inúmeras lojas de recordações e cafetarias empilhadas ao longo do passeio. Transeuntes dormem, absortos, à medida que caminham. Onde fica o Tuatara? Para a direita. Não. Para a esquerda. Continua nesta rua que estás bem. Decido continuar o meu caminho para não me atrasar.

Porém, ao longo da rua, reparo em algo inusitado: um manto luminoso envolve todas as portas da rua. Pequenas velas foram colocadas à entrada das lojas, iluminando a rua, já amarelecida pelo findar do dia. Talvez fosse uma pequena festa que os comerciantes da primeira geração decidissem fazer em louvor dos objectos antigos, da antiguidade deste país que já vai em oitocentas gerações de pedras. Entro na primeira que aparece.

Uma edição antiga d'Os Lusíadas entra-me nos olhos como se chamasse por mim. O que deseja? pergunta um senhor de olhos pequenos, com uma camisa branca estilo anos 60, bem retro. Caminha lentamente, como se o tempo tivesse terminado, quase em câmara lenta, pensando cada passo, decidido, mas prudente na inspecção da minha pessoa.

Nada, apenas olhar o livro. É tão antigo. É. Se o senhor quiser, posso mostrar-lhe uma coisa que tenho aqui atrás. Edições antigas de Herculano, Garrett, Fernando Pessoa. Quer ver?

Caminho de peito erecto, decidido, apesar de estar atrasado. Aliás, se calhar nem sequer iria à festa do Tuatara. É uma seca dançar com desconhecidos e ir a sítios apenas porque se vai. Decido acompanhar o dono da loja.

Caminhamos por um corredor estreito, até que, no fundo, vislumbro uma porta com um símbolo gravado no meio. Ele abre-a. Dá para um beco cheio de caixotes e caixas de papelão empilhadas. Pode sair. É aqui. Saio, com os olhos rendidos à maravilha que via. Dezenas e dezenas de volumes escancaram o pó perante o meu corpo indefeso. Até que ouvi um baque. A porta é fechada com um estrondo e, posteriormente, encerrada à chave. Mas que?... Não é preciso tanto. Grito. Não me feche cá dentro!...

Resignado, fico um bocadinho no beco, escrevinhando e tomando notas. Encontro, de facto, aquilo que queria, mas porque raio a porra do velho me tinha fechado a porta? Normalmente, fica encostada ou ligeiramente fechada ou um pouquinho aberta para deixar escapar as moscas... Decido inspeccionar o local, pouco recomendado para jovens virgens e estudantes saídos da universidade, desejosos que estão de ter um emprego estável e dinheiro ao fim do mês. Provavelmente, eu seria uma espécie de Johnny Depp caçador de tesouros e livros antigos. Roubo um de demonologia, que se insurgia para mim, levantei-me do chão e avancei para o interior do beco. No fundo, não visível anteriormente, diviso uma portada que anunciava um conjunto de degraus. Parecem intermináveis, enormes. Continuo. Afinal de contas, já que estou aqui, devo inspeccionar o local, que parece tão interessante e apelativo para um caçador como eu.

Grito, canto, ouço o meu eco, disperso os sentidos, escrevinho mais um pouco. Até que, de repente, quase tropeço numa lanterna que encontrei no chão. Fixe. Vou descobrir a passagem para o Reino dos Templários (com um rugido grunhento próprio de quem goza com o escuro). Finalmente, ao fundo, as escadas terminam e vejo uma porta. Aproximo-me. O que será que está por detrás dela? As obras do Metro? A casa subterrânea de algum rei esquecido? Um local para um ritual demoníaco? Talvez estas perguntas sejam apenas perguntas, mas o que me aflige é a minha curiosidade que se exacerbava, mesmo tendo em mente que poderia correr perigo. Abro a porta. Com a lanterna, ilumino a sala. Parece um claustro monástico, bastante antigo, mas um pouco frio. Muitos trapos velhos e velhos lençóis empilhados por todo o lado. Provavelmente, seria a habitação de algum monge eremita, que decidisse habitar debaixo da terra, assim como no Mosteiro dos Capuchos, em Sintra. Mas, não. Estamos na porra da cidade de Lisboa e ninguém vive debaixo da terra como um monge, muito menos debaixo de um prédio de 5 andares.

No meio da sala, uma mesa e um livro. Decido ler um pouco. O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde. Folheio lentamente as páginas, enfeitiçado pelo poder das palavras. É estranho, li quase toda a obra de Oscar Wilde, mas nunca me apeteceu ler este livro. Talvez, agora fosse o momento indicado para o fazer. Uma hora passa-se. Duas. Três. Li o livro, como se das páginas se fluísse um chamamento.

Quando o acabei, ouço uma voz que me sussurra aos ouvidos e quase me estremece o corpo. Vai para a passagem secreta. Levanto-me. Ao longe, vejo um pequeno túnel que se estreitava para a minha esquerda. Entro e, de repente, vejo ainda mais outro e mais uma porta.

Quando a abro, deparo-me com a maior surpresa de toda a minha vida: à minha frente, vejo aquilo que parece ser a minha imagem, mas bastante mais velho, com pequenos fios de cabelos brancos. Digamos dez anos mais velho, com a pele cansada e um pouco agastado. Pensei no que aquilo poderia ser: eu sempre me preocupei em descobrir a verdade, mesmo que tal me corroesse. Sempre me preocupei em olhar, ler, conhecer, revelar. Choro um pouco. Não quero ser (apenas) assim, não quero ser tão agastado e seco. Belo, mas seco e sem vida.

Quando toco naquilo que eu poderia ser, mas que ainda não o era, na minha cara rota de peles, ela foge. Grita.Para onde vais? Para onde vou, murmuro eu. Calo. Calo-me. Algumas palavras imperceptíveis de chamamento. Choro mais uma vez. Caminho mais uma vez.

Um pouco mais à frente, como que anunciando um vento forte, vislumbro uma outra porta. Já não me importo com o que venha. Posso morrer à vontade. Abro-a. Quando entro, vejo várias mesas de mármore e estatuetas espalham-se ao longo dos arbustos e das pequenas frondosas árvores. A estátua do Pensador, de Rodin, no centro. Aproximo-me.

O caminho anuncia uma larga avenida que dá para uma pequena torre lá à frente. Talvez seja um simulador de Paris, com o Pensador simbolizando tudo o que eu mais queria fazer: pensar, pensar, pensar. Corro, corro, corro. Aproximo-me da torre, cada vez maior, mas, ao mesmo tempo, serena. Abro uma pequena porta (mais uma! - estes locais são o paraíso das portas, só pode ser!) e subo por umas escadas em espiral. Subo, subo, subo, cada vez mais, cada vez com mais rapidez, mas com menos força. No final, uma porta verde e a entrada de um quarto bem mobilado, com móveis antigos e com livros nas estantes. No fundo do quarto, um armário e, por detrás, um pequeno cofre. Abro-o. E encontro um livro. Mais um livro. Que diz,

"dorme e sonha. Bem-vindo à tua própria torre".

Quando acordo, o velho olha-me, sobressaltado. Finalmente! Encontrou o que queria?

FIM

Thursday, December 20, 2007

animais parciais

doenças venéreas nas paredes
o coração das conchas
um grito ao longe
o fogo numa caixa
três espirais?

ao meio dia, um deus
gente cansada no comboio
animais parciais

o mesmo quarto mas ontem
um poema fóssil
uma pata de uma animal longínquo
a praia tinha sol mas pessoas?
aquele mar maior

"segredos , sebes, aluviões"
o universo sentado
encontrar um livro
a atenção pescoço curvado
a rótula está dorida
uma ossada, um uivo
uma brincadeira?
lajes de pedra escutam-nos

sobre poesia

"A certaines heures, la poésie propage des ondes de calme. D'être imaginé, le calme s'institue comme une émergence de l'être, comme une valeur qui domine malgré des états subalternes de l'être, malgré un monde trouble. L'immensité a été agrandie par la contemplation. Et l´attitude contemplative este une si grandeur valeur humaine qu'elle donne une immensité à une impression qu'un psychologue aurait toute raison de déclarer éphémere et particuliére. Mais les poèmes sont des réalités humaines; il ne suffit pas de se référer à des "impressions" pour les expliquer. Il faut les vivre dans leur immensité poétique."

Bachelard, Gaston; La Poétique de L'Espace (p.190)



tombo vs tomo

O tira-teimas


tombo


de tombar

s. m.,
acto ou efeito de tombar;
trambolhão;
queda;
prov.,
espécie de armadilha de caça;
Brasil,
cachoeira alta, volumosa, em queda vertical.


do Lat. tumulu?

s. m.,
matriz de terreno;
arquivo;
registo de coisas ou de factos, relativos a uma especialidade ou região.


Torre do Tombo: arquivo nacional onde se guardam manuscritos antigos e documentos de maior valor histórico.




tomo | s. m.
1ª pess. sing. pres. ind. de tomar

tomo


do Lat. tomu < Gr. tómos, pedaço, fracção

s. m.,
cada um dos volumes de uma obra científica ou literária;
fascículo;
divisão;
fracção;
parte;
fig.,
valia;
alcance;
volume.



in www.priberam.pt

Wednesday, December 19, 2007

"E na palma da tua mão
busco ternura
sem contar meses, anos, dias
sem saber se já te chorei por inteiro
o suficiente
para não voltar a perder-te!"
Vasco Gato
in: Um mover de mão

Wednesday, December 12, 2007

lançamento do livro


Tuesday, December 11, 2007

Exercício de escrita criativa em que nos são dados alguns elementos para a construção de um texto... o resto é connosco.

Os elementos são:
Estrada, Floresta, Vidro, Chave, Clareira, Lago, Animal, Casa, Muro

Eis o meu resultado:

Estrada às curvas direitas de pedras, plana, sem fim à vista, de pedras na estrada, mato nas bermas, mato não, ervas, mais ao lado árvores frondosas velhas, perde-se de vista, plano para lá das árvores, ao fundo muito longe algumas mais. Finalmente a estrada é interrompida por um caminho que acaba por levar a uma densidade de árvores... uma floresta que nem sabia ali existir. O sol aquece por entre as folhas, ouvem-se pássaros, passos mas silêncio. Tranquilo calor de silêncio quente.

Entretanto nesta envolvência, tropeço numa garrafa vazia de vinho, garrafa verde de um vinho qualquer. Suja de terra de floresta. Continuo a andar ao reparar em algo diferente de um tronco. Uma chave, grande, velha como as árvores velhas desta floresta velha, enferrujada, duas entradas, maior que a minha mão, pesada como uma pinha nova, que contaria ela se falasse? Meto-a na mochila. É boa para a minha parede da sala.

Surge uma clareira mais à frente, à esquerda, de meter medo. Parede redonda e densa de escuridão e folhagem que me ultrapassa a imaginação e me mata logo ali a curiosidade. Nem um passo mais.

Rapidamente me afasto passando uma pequena subida. Eis que surge um lago do lado direito, com uma luz esplendorosa a erradiar reflexos nas folhas, troncos, eu... rãs calam-se à minha presença. Logo chafurdam para as profundezas da água enquanto aguardam pacientemente, como quem não tem mais nada para fazer, que eu me retire do espaço que lhes pertence, que logo tomam conta ruidosamente mal eu lhes faço meia vontade porque fico escondida a ouvi-las “gritar”. Acabo por ceder completamente. Venho-me embora.

Mais à frente está um coelho a olhar para mim, a ruminar, sereno, impávido à minha presença. Parece que me olha nos olhos e me enfrenta, do seu baixo pedestal. Ignoro-o mas com certa relutância. Tem um ar um pouco maléfico do qual me afasto rapidamente. Contraiem-se-me os músculos de medo. Sinto-me parva pela razão.

- Olha, uma casa linda!
Aproximo-me mas com um formigueiro no estômago. Tem um ar abandonado mas uma casa já não pressupõe um simples coelho ou rã... mas algo do nosso tamanho e suficiente para nos enfrentar... parece ter sido deixada de repente. A loiça está a escorrer à janela de vidro partido, molas nas cordas, sem ruídos... deixaram de se ouvir os pássaros mas oiço as rãs o que me conforta de alguma maneira. Mantém-me presa à realidade. Estou calma porque ouço as rãs... mas atenta ao silêncio porventura absoluto.

Avanço devagar. Tem um portãozinho onde deveria ter sido um jardim. A casa tem 2 pisos. O de baixo está completamente vandalizado, portas fora, colchões queimados. O 1º parece intacto, subo as escadas para espreitar lá para dentro. Como pensava, quem não voltou, pensava mesmo que voltava em pouco tempo. Em cima de uma mesa enorme de madeira repousa um tacho com uma colher grande dentro... um casaco numa cadeira... um banco caído...
Ansiedade... rapidamente desço as escadas, contorno a casa e tento sair dali. Ponho-me ao caminho já sem saber porque alguma vez me pus a um caminho... já nem parece o mesmo. Já não oiço rãs já nem sei à quanto tempo. O coração dispara. Este caminho sobe, tem pedras enormes, obstáculos monstros que já não pertencem à mesma estradita. Já não há calor, nem luz esplendorosa, nem pássaros, nem rãs. Já só oiço a minha respiração difícil e as pedras a rolarem atrás de mim, passos dados, pedras atrás. Já não há arvores velhas mas novas e rebeldes, todas cruzadas, obstáculos em caminho que já não caminho e mesmo rápido não sei por onde vou quando de repente o maior obstáculo humano... encontro um muro à minha frente no meio da vegetação que nem consigo contornar e não vejo nada. O Coração quase me salta do peito e eu já não oiço mais as rãs!

Monday, December 10, 2007

Meditação sobre Kraft de Magnus Lindberg



(fotografia de Henri Cartier-Bresson, "Henri Matisse", 1944)

o fogo. a rebelião do fogo. o silêncio. escrevo um texto no sentido corrente do fogo. a tempestade. como um alarve de indumentária branca. baixo. fogo, as armas nos canhões.

diz a música nos trabalhos da guerra. mortos. pedaços de relógios assumindo o seu poder de morte. tento e calo-me. sou só eu. a nuvem branca, a branca paisagem no tiquetaque da penugem do corpo.

abro as mãos. e as formigas. sou o receptáculo da pele. batida. batida. coração. coração. abro. abro. abertura da ordem dos peixes. o tiquetaque da génese matemática. cala-te. o caçador engole-te a presa. e invoca o anjo e engole a seiva na vontade e no poder do fogo.

anima-te de sangue
e
anima a alma do bárbaro.

a selva. um dia. dois. o cavalo. dois cavalos. e a cabeça de um rinoceronte de barbas vermelhas. piano. um poema que segue admirando o funeral de um oboé. o violoncelo faz sexo com um trombone e cria a Metamorfose de Kafka virada ao cubo.

vermelho
preto
duas cores

atira uma pedra para a fuça de um pardal. queres matá-lo, eu sei. todos os dias são dias de sangue. é a guerra. já diria fausto. com os crocodilos à flor do lácio. e as pernas deitadas no amanhecer do caos de açúcar. já experimentaste fumar um cabide de pele? e engoli-lo. e saudá-lo como se saudaria César e um pombo com o esqueleto de um pardal.

sirene. sirene. ronco. ronco. ronco. a carga da brigada ligeira. os massacres de amritsar. um morto. dois mortos. três. quatro. quantos mais indianos morrerem, mais a Inglaterra será a rainha da civilização.

quero jogar ping pong. a bola. duas bolas. berlim ocidental e oriental. um muro separa as duas guerras. a da direita e a da esquerda. à frente ou atrás? pela direita de lugar nenhum, como o silêncio fosse só nosso.

Kraft das werk americanische. Bush lo sanguinaria che riconosche Mongo Santamaria as a very good piano player.

uma pauta de. Pan. o pandemónio do relógio que se esquece de dar as horas. so contrário, a direita, no silêncio e na escuridão. quero amanhecer. parece manhã. tenta descobrir Peer Gynt na melodia desta música.

talvez o amanhã seja apenas hoje. e hoje seja um dia como outro qualquer. pim. um pároco que se envaidece de olhar um violino agastado. para lá do outono e onde o cravo não ferra na definição religiosa do amor.

quero telefonar e tocar tamborete neste coreto sem qualquer ligação eclesial com a violência. quero um fagote. e uma bateria que se descuide. logo através do ronronar de um morcego adormecido de ódio.

os óculos olham e vislumbram que a tempestade se aproxima. o fogo. a treva. uma mulher nua na cama de pirâmides selvagens. auf. auf. faz o cão e as kraft der americanische autoren.

rómulo matou remo e comeu as suas próprias vísceras. Dioniso/Cronos/Odin no templo sagrado do Lácio invocando o fogo da pedra chã. e rasa. e sem forma. disforme. lamacenta.

atreve-te.
sugere.
rouba.
mata.
escreve um livro com as palavras dos livros.
um romance na ribanceira da alcova. e um cigarro aberto. que não apaga. e nunca se deita. para tu morreres de combustão permanente.

e sem fim.

rómulo matou remo. acercou-se de todos nós e pediu licença para vomitar.

Jorge Vicente

livro de estreia


Coemcei a ler o livro de António Brito, que será lançado nesta semana. Vou na página 30 e estou preso ao enredo. (as considerações abaixo expressas são provisórias e são inferências feitas a partir dessa amostragem).
O livro trata de um indivíduo que nascido na raia beirã acaba por ir parar a Moçambique para defender o Império dos portugueses.
O livro é contando na primeira pessoa, na decadência da velhice. Tem um esquema clássico de narrar que é o da analepse. No tempo presente alguém conta acontecimentos passados. O destinatário da mensagem não está realizado na narração por isso "conta" para o leitor. Basicamente tem dois grandes corpos de analepse encaixados. Tendo nós acesso a três tempos. O da narração no presente. O da ida para África e, nessa ida, a introdução de memórias mais antigas da vida e infância beirã.

Recordo que esquema em analepses acontece na literatura desde o Ulisses de Homero. Na corte dos Feaceos. Primeiro o Aedo Demódoco canta os acontecimentos da guerra de Tróia. E depois Ulisses conta as suas desventuras aos pais de Nausicaa (filha dos reis dos Feaceos). É a primeira grande estrutura em analepses. (excepto no Gilgamesh em que ao herói é contado o dilúvio. Mas essa é uma narrativa mítica que lhe é contada)

O enredo, para este livro, é o mais importante. Assistimos assim ao desenvolvimento da peripécia e da situação. Estando elegantemente bem escrito assistimos a um trabalho aturado do uso de metáforas e de comparações (que para Jackobson são dois aspectos da mesma figura de estilo).

O livro, quanto a mim, só tem um senão. É um livro que segue a grande tradição do romance ocidental, tradição esta que teve o seu apogeu no século XIX com os grandes romancistas. Este é um tipo de livros que é muito comum e apreciado pelo público que tem assegurado a fortuna do género romance.
A estratégia discursiva deste livro escapa a inovações ou aventuras narratológicas. Tendo a vantagem por um lado de ser estremamente claro e agradável de ler.
O género romance, no seu geral, opta por se apresentar com a maneira de contar oitocentista. Como se não tivesse acontecido o Ulisses do James Joyce, ou o Húmus do Raúl Brandão, ou tantos livros que inovaram nas estruturas mais fundas do romance. Um autor que retoma a tradição da inovação a estes níveis é, sem dúvida, o António Lobo Antunes.

Mas, o livro do António, dentro de uma maneira de escrever conservadora é perfeito. O que já não é nada, mas mesmo nada mau.

Parabéns António!

p.s. de qualquer das maneiras há um problema grave nesta minha mini reflexão sobre inovação e tradição. É que o pós-modernismo pôs em causa noções como conservador ou vanguardista. Essas distinções deixaram de fazer sentido. Quando começo a pensar nestas questões acabo sempre na dúvida não metódica. É o problema do nosso tempo: os sofistas triunfaram sobre as certezas platónicas. Quem ganhou o debate milenar foram os sofistas. Os sofistas tiveram a perder durante quase dois mil e quinhentos anos. E de repente estão a ganhar. e se calhar ainda bem para todos nós!

Thursday, December 06, 2007

Quarteto para o fim dos tempos - Olivier Messiaen II

Afinal encontrei aqui uns samples

http://www.amazon.com/gp/product/B000001G8W

Quarteto para o fim dos tempos - Olivier Messiaen

A propósito do fim do mundo de ontem... gostava de encontrar um trecho em mp3 para vos mostrar, mas à sua falta fica aqui um link para uma crítica bastante interessante acerca da peça.

http://www.blogger.com/img/gl.link.gif


Xanda

Tuesday, December 04, 2007

vinte e uma coisas

01. sujeito com caderno.
02. um rádio com música clássica nos seus circuitos ferrugentos.
03. dores musculares mas muito ligeiras.
04. quarto com graffitis nas paredes.
05. cortinas brancas.
06. o sonho de ontem.
07. um livro sobre símbolos.
08. migalhas de lenha no chão.
09. quadro vermelho de rosto pesado.
10. a deslocação do ar lá fora.
11. a morte a dormir no seu ninho.
12. saco de boxe pendurado com corrente.
13. ansiedade sem forma.
14. coluna vertebral.
15. guarda-fato de madeira altivo.
16. micro fungo entre os dedos dos pés.
17. a respiração a passar nas narinas.
18. uma vela acesa.
19. uma girafa de madeira sem cabeça.
20. o tecto pisado pelo tempo.
21. uma caneta com palavras diluídas na carga.