Monday, December 10, 2007

livro de estreia


Coemcei a ler o livro de António Brito, que será lançado nesta semana. Vou na página 30 e estou preso ao enredo. (as considerações abaixo expressas são provisórias e são inferências feitas a partir dessa amostragem).
O livro trata de um indivíduo que nascido na raia beirã acaba por ir parar a Moçambique para defender o Império dos portugueses.
O livro é contando na primeira pessoa, na decadência da velhice. Tem um esquema clássico de narrar que é o da analepse. No tempo presente alguém conta acontecimentos passados. O destinatário da mensagem não está realizado na narração por isso "conta" para o leitor. Basicamente tem dois grandes corpos de analepse encaixados. Tendo nós acesso a três tempos. O da narração no presente. O da ida para África e, nessa ida, a introdução de memórias mais antigas da vida e infância beirã.

Recordo que esquema em analepses acontece na literatura desde o Ulisses de Homero. Na corte dos Feaceos. Primeiro o Aedo Demódoco canta os acontecimentos da guerra de Tróia. E depois Ulisses conta as suas desventuras aos pais de Nausicaa (filha dos reis dos Feaceos). É a primeira grande estrutura em analepses. (excepto no Gilgamesh em que ao herói é contado o dilúvio. Mas essa é uma narrativa mítica que lhe é contada)

O enredo, para este livro, é o mais importante. Assistimos assim ao desenvolvimento da peripécia e da situação. Estando elegantemente bem escrito assistimos a um trabalho aturado do uso de metáforas e de comparações (que para Jackobson são dois aspectos da mesma figura de estilo).

O livro, quanto a mim, só tem um senão. É um livro que segue a grande tradição do romance ocidental, tradição esta que teve o seu apogeu no século XIX com os grandes romancistas. Este é um tipo de livros que é muito comum e apreciado pelo público que tem assegurado a fortuna do género romance.
A estratégia discursiva deste livro escapa a inovações ou aventuras narratológicas. Tendo a vantagem por um lado de ser estremamente claro e agradável de ler.
O género romance, no seu geral, opta por se apresentar com a maneira de contar oitocentista. Como se não tivesse acontecido o Ulisses do James Joyce, ou o Húmus do Raúl Brandão, ou tantos livros que inovaram nas estruturas mais fundas do romance. Um autor que retoma a tradição da inovação a estes níveis é, sem dúvida, o António Lobo Antunes.

Mas, o livro do António, dentro de uma maneira de escrever conservadora é perfeito. O que já não é nada, mas mesmo nada mau.

Parabéns António!

p.s. de qualquer das maneiras há um problema grave nesta minha mini reflexão sobre inovação e tradição. É que o pós-modernismo pôs em causa noções como conservador ou vanguardista. Essas distinções deixaram de fazer sentido. Quando começo a pensar nestas questões acabo sempre na dúvida não metódica. É o problema do nosso tempo: os sofistas triunfaram sobre as certezas platónicas. Quem ganhou o debate milenar foram os sofistas. Os sofistas tiveram a perder durante quase dois mil e quinhentos anos. E de repente estão a ganhar. e se calhar ainda bem para todos nós!

2 Comments:

Blogger jorge vicente said...

é tempo de privilegiar o prazer da leitura e não a tentativa de criar escolas, reflectir sobre elas, tentar ser original, etc. etc.

mas, sem cairmos no facilitismo do mercado.

7:47 PM  
Blogger Joaolsd said...

se o c�ptico homem � a medida de todas as coisas, que o seja, apesar de tudo, atrav�s da mai�utica ao inv�s da ret�rica da tanga

2:25 AM  

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